sábado, 2 de fevereiro de 2013

“Salve Jorge”: Novela exagera na repetição de situações em que personagens que deveriam ser os mais espertos agem como bobos à espera de aplausos do público


Glória Perez é uma novelista reconhecidamente sempre atenta às novidades em questões mundiais que já dominam ou ainda dominarão os noticiários em suas tramas. Mas em “Salve Jorge”, atual novela das nove da Rede Globo de sua autoria, em que o foco central é o tráfico humano, é inacreditável a falta de personagens mais fortes que tragam à tona alerta ao público sobre o tema em questão com um pouco mais de coerência e veracidade. Não sei se é intencional, mas a novelista está promovendo um desfile de personagens que parecem usar viseiras e beiram à total falta de inteligência ou perspicácia. E isso nada tem a ver com classe social ou origem. Eles estão nos núcleos que vão das classes de A a C, do asfalto ao morro, do Brasil à Turquia. E, como o assunto é sério, muito sério, causa certo desconforto algumas situações em que até os personagens que deveriam ser mais espertos agem como bobos da corte. É quase como subestimar a inteligência do público.

Tem prêmio “Salve Jorge Esses Tipos da Babaquice” para todos. Lívia (Claudia Raia) é a toda-poderosa chefe de uma organização que vive tomando bebidinhas do frigobar de um apart e que já aceitou até levar ela própria em sua bolsa um bebê traficado. Al Capone daria gargalhadas se assistisse a tal cena. Nada aconteceu com a vilã, porque a sonsa da Aída (Natália do Vale) acreditou que o choro de bebê que ouviu no carro da falsa agente de modelos estivesse vindo do toque do celular da farsante. Russo (Adriano Garib) é um leão-de-chácara que baixa a cabeça para mulheres e finge muito mal o envolvimento com Lucimara (Dira Paes), a mãe de Morena (Nanda Costa). A doméstica, que por sinal há tempos não aparece fazendo uma faxina, está tão preocupada em arrumar um par de calças que a tire do morro que fica cega ao comportamento estranho da filha. Pior, Lucimara prefere acreditar em qualquer estranho do que na mãe de seu neto. Wanda (Totia Meireles) é a mais sem noção do crime. Além de subalterna da chefia, tenta tirar um por fora fazendo chantagens mal executadas, deixando rastros a cada plano que executa.

Diretamente da Turquia, Berna (Zezé Polessa) é aquela que compactua com atos ilícitos, mas mete os pés pelas mãos ao tentar tirar o corpo fora na hora de assumir responsabilidades, usando argumentos que só justificam a ela própria. Morena, que por mais que seja vítima, em nenhum momento mostra na prática a experiência que ela própria gosta tanto de jogar na cara dos outros por “ser do morro”. A ex-mulher de bandido termina sempre derramando lágrimas diante dos seus ingênuos planos de fuga, que acabam a levando sempre de volta para o covil dos bandidos.

Tem também os dissimulados, que querem se dar bem financeira e materialmente a qualquer preço. Em alguns, o mau-caratismo é mais acentuado, como no de Rosângela (Paloma Bernardi), a traficada que tomou gosto pela coisa e joga sujo para fazer parte da chefia da organização criminosa. Em outros, a ambição é disfarçada, como é o caso de Isaura (Nívea Maria), mais preocupada com seu casaco de peles, guardado num cofre alugado em Paris, do que com a situação precária da família. E o das interesseiras Aída, Amanda (Lizandra Souto), Rachel (Ana Beatriz Nogueira) e Yolanda (Cristiana Oliveira), todas de olho na herança de Leonor (Nicette Bruno).

E os títulos de Babacas de Plantão vão para... Celso (Caco Ciocler), um fracassado profissional e emocionalmente que representa o pior exemplo de comportamento que um pai pode dar em uma separação, sem um mínimo de sensibilidade e psicologia para lidar com a filha nessa situação. Seu rival, Carlos (Dalton Vigh), que até então raramente aparecia e de repente veio servir de estepe para Antônia (Letícia Spiller), a "sócia" de uma agência de modelos que assina documentos sem ler e nunca acompanhou de perto a carreira das agenciadas da empresa. Sem falar em Théo (Rodrigo Lombardi), um capitão do Exército que faz ronda no Complexo do Alemão e nunca ouviu falar de tráfico de pessoas. Vai ser desinformado assim em outros batalhões.

Para encerrar, Heloísa (Giovanna Antonelli), a delegada com horário de trabalho mais flexível do planeta, pois aparece muito mais em casa do que na delegacia, que quando não está fazendo compras ou se fazendo de difícil para o ex-marido, está demonstrando não ter o menor tato nas suas investigações. No capítulo dessa sexta-feira (1), ao interrogar Lívia sobre o sumiço de Morena, ela se mostrou totalmente inábil na função. “Por que você estava pressionando a Morena? O Théo contou que você estava ligando insistentemente para ela!”, inquiriu ela. Primeiro: se Lívia é suspeita, Helô não poderia deletar de cara quem contou a ela que a interrogada estava pressionando a pessoa desaparecida. Segundo: suas perguntas são sempre formuladas quase que entregando ao suspeito uma resposta pronta de defesa. É o popular “deixar a bola quicando” a favor do bandido. Se bobear, será Aisha (Dani Moreno) que conseguirá descobrir por conta própria não só sua origem, como ainda vai desmascarar os traficantes.


Mais "Salve Jorge", em:

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