domingo, 22 de março de 2015

“Babilônia”: Com texto excepcional e temas atuais, primeira semana divide o público entre amor e ódio por relação homoafetiva entre mulheres na terceira idade


Em apenas uma semana no ar, “Babilônia”, nova novela das nove da Rede Globo, já conseguiu o que outras não conseguiram nem em meses: despertar sentimentos de amor e ódio no público, ambos com a mesma intensidade. De autoria de Gilberto Braga, Ricardo Linhares e João Ximenes Braga, a história mescla cenas fortes, texto contundente e situações polêmicas. Logo na estreia, na segunda-feira (16), já se viu Beatriz, em mais uma interpretação magistral de Glória Pires, matando com um tiro a sangue frio o amante para escapar da chantagem feita por Inês, vivida por Adriana Esteves, que promete se superar depois da sua marcante Carminha de “Avenida Brasil”. Ponto para as duas atrizes que prometem viver um duelo de titãs, como ficou comprovado durante a semana, não apenas pelo talento de ambas, mas também pelo texto primoroso dos autores. Como não se deliciar quando Inês fala: “Você sabe o que é ser advogada num país sem Justiça?”. E, em outro momento, é a vez de Beatriz afirmar com ironia: “O bom advogado é o que conhece as leis. O excelente advogado é o que conhece os juízes!”. Qualquer semelhança não é mera coincidência.

Ainda no primeiro capítulo, Fernanda Montenegro e Nathalia Timberg protagonizaram um beijo na boca, já que suas personagens, Teresa e Estela, respectivamente, formam um casal da terceira idade assumidamente vivendo uma relação homoafetiva. O que mexeu com a ala mais conservadora ou menos preparada para ver na prática o que tem ouvido só na teoria ou ainda que não aceita que esse tipo de condição sexual não é uma invenção das novas gerações.

Fora essa polêmica (?), o que vale mesmo é que a novela no seu todo traz críticas sociais e políticas claramente expostas através da maioria de suas personagens. Não é nem preciso ir muito longe para se encontrar na vida real exemplos semelhantes a Aderbal Pimenta, o político corrupto vivido por Marcos Palmeira. Nem de cafetões disfarçados de príncipes que circulam pela capital carioca como é o caso de Murilo, personagem de Bruno Gagliasso, que, diga-se de passagem, ainda está muito preso ao seu perfil em “Dupla Identidade”. Camila Pitanga também poderia buscar um tom que não torne a sua Regina, que tem tudo para ser uma mulher forte diante do que já viveu e continua vivendo, em uma mocinha boba que aceita tudo com um sorriso congelado porque quer passar a imagem de que é muito legal morar na favela e ser mãe solteira da filha de um homem casado que a enganou. No caso, Luís Fernando, vivido por Gabriel Braga Nunes, que está se repetindo ao dar ao personagem nuances de Leo, trabalho que marcou sua volta à Globo em “Insensato Coração”. Já Sophie Charlotte deixou para trás a Duda do remake de “O Rebu” e voltou repaginada na pele da Alice Junqueira, filha de Inês que promete ainda causar muito. A atriz não deixou a dever em nada nos embates que teve até aqui com Adriana Esteves. A cena do aborto espontâneo da personagem foi realizada com a delicadeza indispensável ao momento.

Em termos de direção geral e de arte, iluminação, figurino e cenografia, a novela ainda não trouxe nenhuma grande inovação, mas tem sabido aproveitar muito bem todas as locações, tanto nas imagens iniciais feitas em Paris, na França, e em Dubai, nos Emirados Árabes, quanto nas sequências cotidianas em bairros e praias do Rio de Janeiro e, especificamente, na favela Babilônia, localizada no bairro do Leme, Zona Sul carioca. Felizmente não optaram pelo óbvio de colocar como tema da abertura a música “Rio Babilônia”, de Jorge Bem Jor, nem “Babilônia Rock”, de Fernanda Abreu, ou “Jardins da Babilônia”, de Rita Lee. O samba “Pra Que Chorar”, de Vinícius de Moraes e Baden Powell, cantado por Mart’nália, encaixou perfeitamente. Mais um dos muitos pontos a favor. Aguardando os próximos capítulos que, esperamos, ainda venham nos surpreender, assim como continuamos pedindo que esse (novo?) Brasil mostre sua cara.